Mudanças no estilo de vida com tratamento multimodal da dor pélvica na Clínica de Terapia da Dor (CTD) podem evitar uma cirurgia. Foto Reprodução iBahia
Mais comum do que muita gente imagina, a endometriose impacta a vida de pelo menos uma em cada 10 mulheres em idade fértil no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, e cerca de 10% da população feminina global, dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). Apesar desses números, muitos mitos ainda permeiam a doença, que pode levar anos até o correto diagnóstico.
Em linhas gerais, a endometriose é caracterizada pelo crescimento do tecido endometrial, que reveste a cavidade uterina, para fora do órgão reprodutor, atingindo outros órgãos como ovários, tubas uterinas e intestino. “Caso não diagnosticada e tratada corretamente, a endometriose provoca fortes dores antes, durante e após o período menstrual, dores na região pélvica, dores nas relações sexuais, podendo inclusive levar à infertilidade”, explicou Dra Mara Valéria Mendes, especialista em Clínica da Dor (RQE 19744), na Clínica de Terapia da Dor (CTD), Ginecologia e Obstetricia (RQE 3978).
Sobre o diagnóstico, que em alguns casos leva mais de sete anos, Dra Mara esclarece que parte da demora está relacionada a um dos mitos que envolve o assunto: sentir dor durante a menstruação é normal.
“Não! Sentir dor nunca é normal, sobretudo quando é uma dor persistente. Crescemos ouvindo exatamente o contrário. Então, por vezes, a paciente só leva ao conhecimento do médico as dores que sente durante o período menstrual quando chega no nível máximo de dor ou quando isso passa a impactar fortemente em outros aspectos da vida, a exemplo da dificuldade em engravidar”.
Este, aliás, é outro ponto que merece destaque. A endometriose é uma das causas de infertilidade feminina e segundo dados da Associação Brasileira de Endometriose, mais de 30% dos casos levam à infertilidade. Porém, nem todas as mulheres com a doença terão o sintoma.
Para ser considerado infertilidade, mulheres abaixo de 35 anos devem esperar pelo menos um ano para que ocorra uma gravidez espontânea. No caso de mulheres acima de 35 anos, o período é de pelo menos seis meses.
“Mulheres com endometriose podem engravidar, da mesma forma que mulheres que já são mães podem receber o diagnóstico de endometriose. Ou até, mulheres podem ter dificuldade em engravidar e não estar relacionado à doença. Então é sempre importante conhecer o seu corpo e fazer as consultas regulares, informando qualquer sintoma”, acrescentou Dra Mara.
Analisando cada caso de endometriose Estima-se que a endometriose atinja cerca de 200 milhões de mulheres no mundo, nem todas diagnosticadas e nem todas com sintomas.
“É importante frisar que existem casos de mulheres com endometriose que não sentem dor alguma. Além disso, a intensidade da dor não está diretamente relacionada à extensão do dano causado pela endometriose. E, em todos os casos, a avaliação clínica será essencial”, pontuou.
Dra Mara destaca que apesar dos exames ginecológicos estarem cada vez mais precisos, o ultrassom transvaginal de rotina sozinho não é suficiente para detectar um foco de endometriose. De acordo com os sintomas da paciente, o médico pode encaminhar para uma ultrassom para pesquisa de endometriose profunda ou uma ressonância magnética pélvica.
“Já as pacientes adolescentes, por exemplo, que relatam dores menstruais, devem ficar sempre no radar, pois são mulheres que podem vir a desenvolver um quadro de endometriose. Nestes casos as recomendações são sempre pautadas na melhoria da qualidade de vida, alimentação saudável e prática de exercícios, fatores que vão contribuir para minimizar possíveis impactos futuros”.
Quanto à cirurgia para retirada de útero, é um medo desnecessário e precipitado. “Nem toda mulher com endometriose precisará passar por histerectomia, até porque nem sempre a região acometida pela doença é o útero. Se, após realização do tratamento hormonal associado ao tratamento recomendado na Clínica de Terapia da Dor, as dores persistirem, será avaliada a recomendação de cirurgia, com equipe médica especializada. A cirurgia para tratamento de endometriose geralmente é minimamente invasiva por via laparoscópica e/ou robótica”.
Hereditariedade, prevenção e tratamento “Hoje já se sabe a importância de acompanhar também o histórico familiar dessa paciente, havendo um risco hereditário para endometriose. Porém estamos falando de uma pequena porcentagem”, informa Dra Mara.
Segundo a especialista, a endometriose é uma doença multifatorial que acomete as mulheres, sobretudo na idade reprodutiva. “Antigamente as mulheres casavam cedo, logo engravidavam e tinham um número maior de filhos, com isso elas passavam menos tempo menstruadas. Hoje, além da nossa alimentação ter saído do natural e se direcionado para os alimentos multiprocessados, as mulheres estão expostas à rotinas com maior carga de estresse, optam por ter menos filhos e quando já estão com 35 anos ou mais, e assim, passam mais tempo menstruadas”.
Apesar de não existir uma relação entre saúde mental e a endometriose, mulheres que passam por um quadro de depressão ou ansiedade, serão mais sensíveis à dor, o que pode agravar o quadro.
“Por isso preconizamos o tratamento dessa paciente na Clínica de Terapia da Dor, pois não se trata apenas de questões ginecológicas. Requer um acompanhamento completo, com protocolos farmacológicos, desde hormônios à medicamentos para o controle da dor, bem como acompanhamento psicológico, bloqueios anestésicos, acupuntura neuromodulatória, dieta antiinflamatória recomendada por nutricionista, fisioterapia pélvica e exercícios físicos, que vão agir de forma simultânea”, explicou.